quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009




CURUMIM

QUE MUNDO
VOCÊ ESPERA
DE MIM?




'Só os índios, hoje, se preocupam com o futuro. Os brancos só olham para o presente'.

Entrevista com Dom Erwin Kräutler


“Se a gente toma posição a favor dos colonos, sem-terra, agricultores, sem-teto, isso provoca alguém que pensa que vai perder com essa posição.” Foi assim que Erwin Kräutler, bispo de Altamira, município situado em plena selva amazônica do Pará, “adquiriu” seus inimigos. Lá, ele enfrenta os perigos que sua posição o impõe, incluindo constantes ameaças de morte. Por 23 anos, trabalhou ao lado de Irmã Dorothy Stang, até quando, em fevereiro de 2005, aqueles que tanto o ameaçam contra sua luta tiraram a vida da missionária estadunidense."

IHU On-Line – Como é para o senhor enfrentar os perigos de lutar contra os poderosos da Amazônia?

Dom Erwin – Acredito que não conseguimos enfrentar, de verdade, porque o problema é que tomamos posição e não procuramos brigar nem provocar ninguém. No entanto, se você toma posições a favor de um segmento da sociedade que é menos favorecido, você se torna adversário dos outros sem querer, porque contraria interesses de governança. Por exemplo, eu me coloquei ao lado dos povos indígenas, que têm direito à sua terra e isso é, automaticamente, visto como característico de quem é contra o progresso e desenvolvimento. Se a gente toma posição a favor dos colonos, sem-terra, agricultores, sem-teto, isso provoca alguém que pensa que irá perder com essa posição. De modo especial, esses aventureiros que vão para a Amazônia e querem enriquecer da noite para o dia se sentem “pisados no calo”. E eles reagem porque não têm argumento. Quem não tem argumento reage de maneira irracional, com ódio, faz ameaças e tem rancor.


IHU On-Line – Para o senhor, o que está em jogo em Roraima?

Dom Erwin – A área de Raposa Serra do Sol foi demarcada e homologada. O processo de demarcação de área indígena é o seguinte: primeiro se identifica a área, através de estudo antropológico. Depois, ela é delimitada. A seguir, é feita a demarcação, onde a área é oficialmente indígena. E o passo final é a homologação, ou seja, o presidente assina o decreto dizendo que essa área é indígena. Esse é o caso de Raposa Serra do Sol, pois a área foi homologada. Todos os passos foram feitos. Agora, claro, aqueles que estão lá dentro não têm direito de ficar. A área é indígena, e não de terceiros, que a invadiram. Então, o governo tem obrigação, através de suas forças, de tirar os intrusos. No momento, acontece o seguinte: seis arrozeiros se negam a sair. Através dessa liminar do Supremo Tribunal Federal, que solicitou a suspensão da ação da Polícia Federal para retirá-los, eles passaram a se sentir na pele da lei. Esse é o maior absurdo que já ouvi na minha vida. Nossa justiça é classista, pois defende o direito dos intrusos, dos que não têm direito. Os arrozeiros estão festejando como se tivessem ganhado a maior vitória.

IHU On-Line – Qual é a sua avaliação do governo Lula em relação à violência contra os povos indígenas brasileiros? Qual será a função do relatório que o CIMI lançou durante esta semana?

Dom Erwin – O empenho do atual presidente é de quem não tem muita afinidade com a causa indígena. Ele não conhece bem os povos indígenas e tem uma visão de desenvolvimento que não se pode aplicar a eles. O seu modelo de desenvolvimento é economicista. Não é de um povo, da pessoa, da família. O PAC é um exemplo disso, porque visa o agronegócio, a exportação, aumentar o crescimento econômico e não os valores de um povo.

Nós apresentamos o relatório sobre a violência contra os povos indígenas 2006-2007 e ele é estarrecedor, pois, ao invés de diminuir, aumentou muito. Não é possível que aqui no Brasil, em pleno século XXI, ainda se mate índio a torto e a direito. O índio é, também, induzido ao suicídio ao ser encurralado numa área diminuta e não tem condição de sobreviver nem fisicamente nem culturalmente. Esse relatório é uma chamada para mobilizar a sociedade e o governo para dar um basta na violência que ceifa a vida dos índios.

IHU On-Line – Qual é a sua avaliação da Assembléia dos bispos desse ano?

Dom Erwin – Foi muito positiva, no sentido de que conseguimos vencer uma pauta enorme e homérica. Discutimos os documentos e as Diretrizes da Ação Pastoral 2008-2010 e, depois de várias notas, escrevemos novos documentos, inclusive uma moção de apoio aos povos indígenas de Raposa Serra do Sol. Depois, os bispos escreveram um documento de solidariedade aos outros que estão ameaçados de morte, entre outras muitas coisas.


Entrevista na íntegra:

http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_entrevistas&Itemid=29&task=entrevista&id=13213


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